quarta-feira, julho 29, 2009
terça-feira, julho 28, 2009
quinta-feira, julho 23, 2009
Não sabemos nada
Nunca saberemos se os enganados
são os sentidos ou os sentimentos,
se viaja o comboio ou a nossa vontade
se as cidades mudam de lugar
ou se todas as casas são a mesma.
Nunca saberemos se quem nos espera
é quem nos deve esperar, nem sequer
quem temos de aguardar no meio
de um cais frio. Não sabemos nada.
Avançamos às cegas e duvidamos
se isto que se parece com a alegria
é só o sinal definitivo
de que nos voltámos a enganar.
Amalia Bautista
Nunca saberemos se os enganados
são os sentidos ou os sentimentos,
se viaja o comboio ou a nossa vontade
se as cidades mudam de lugar
ou se todas as casas são a mesma.
Nunca saberemos se quem nos espera
é quem nos deve esperar, nem sequer
quem temos de aguardar no meio
de um cais frio. Não sabemos nada.
Avançamos às cegas e duvidamos
se isto que se parece com a alegria
é só o sinal definitivo
de que nos voltámos a enganar.
Amalia Bautista
quarta-feira, julho 22, 2009
terça-feira, julho 21, 2009
segunda-feira, julho 20, 2009
tradução caseira da lebre
Chamo-me Ofélia. Aquela que não vai conseguir aguentar. A mulher no patíbulo. A mulher com as artérias cortadas. A mulher com overdose NOS LÁBIOS NEVE. A mulher com a cabeça no forno de gás. Ontem parei de me matar. Estou sozinha com os meus peitos as minhas coxas o meu colo. Eu arranco os instrumentos da minha prisão o banco a mesa a cama. Eu destruo o campo de batalha que era a minha casa. Arranco as portas das suas dobradiças para deixar entrar o vento e o grito do mundo. Eu rebento a janela. Com as minhas mãos a sangrar eu rasgo as fotografias dos homens que eu amei e que me usaram na cama na mesa na cadeira no chão. Pego fogo à minha prisão. Atiro a minha roupa para o fogo. Eu desenterro o relógio que era o meu coração para fora do meu peito. Vou para a rua, vestida no meu sangue.
Heiner Mueller
Chamo-me Ofélia. Aquela que não vai conseguir aguentar. A mulher no patíbulo. A mulher com as artérias cortadas. A mulher com overdose NOS LÁBIOS NEVE. A mulher com a cabeça no forno de gás. Ontem parei de me matar. Estou sozinha com os meus peitos as minhas coxas o meu colo. Eu arranco os instrumentos da minha prisão o banco a mesa a cama. Eu destruo o campo de batalha que era a minha casa. Arranco as portas das suas dobradiças para deixar entrar o vento e o grito do mundo. Eu rebento a janela. Com as minhas mãos a sangrar eu rasgo as fotografias dos homens que eu amei e que me usaram na cama na mesa na cadeira no chão. Pego fogo à minha prisão. Atiro a minha roupa para o fogo. Eu desenterro o relógio que era o meu coração para fora do meu peito. Vou para a rua, vestida no meu sangue.
Heiner Mueller
sexta-feira, julho 17, 2009
Por isso, ela ficou ali, de olhos fechados e quase acreditou que também ela estava no País das Maravilhas, embora sabendo que lhe bastaria abrir os olhos, para que a realidade monótona regressasse de novo - a relva restolhada por causa do vento, a água agitava-se por causa dos juncos, as chávenas a chocalhar eram os badalos das ovelhas, e os gritos agudos da rainha eram os gritos do pastor - e os espirros do bebé, os gritos do Grifo e todos os outros estranhos barulhos eram somente (como ela sabia) os barulhos normais de uma quinta - enquanto que os sons do gado ao longe tomariam o lugar dos soluços pesados da Tartaruga Fingida.
Por fim, pensou que a sua irmã pequenina havia também ela de vir a ser uma Senhora; e em como ela guardaria para sempre o coração simples e doce da infância; e em como ela reuniria crianças em seu redor e, por sua vez, lhes faria os olhos brilhar com histórias que lhes contaria, talvez até mesmo o sonho do País das Maravilhas; como ela compreenderia os seus pequenos problemas e as suas pequenas alegrias, recordando a sua própria infância e os dias felizes do verão.
Lewis Carroll
Por fim, pensou que a sua irmã pequenina havia também ela de vir a ser uma Senhora; e em como ela guardaria para sempre o coração simples e doce da infância; e em como ela reuniria crianças em seu redor e, por sua vez, lhes faria os olhos brilhar com histórias que lhes contaria, talvez até mesmo o sonho do País das Maravilhas; como ela compreenderia os seus pequenos problemas e as suas pequenas alegrias, recordando a sua própria infância e os dias felizes do verão.
Lewis Carroll
quinta-feira, julho 16, 2009
E eu quero brincar às escondidas contigo e dar-te as minhas roupas e dizer que gosto dos teus sapatos e sentar-me nos degraus enquanto tu tomas banho e massajar o teu pescoço e beijar-te os pés e segurar na tua mão e ir comer uma refeição e não me importar se tu comes a minha comida e encontrar-me contigo no Rudy e falar sobre o dia e passar à máquina as tuas cartas e carregar as tuas caixas e rir da tua paranóia e dar-te cassetes que tu não ouves e ver filmes óptimos ver filmes horríveis e queixar-me da rádio e tirar-te fotografias a dormir e levantar-me para te ir buscar café e brioches e folhados e ir ao Florent beber café à meia-noite e tu a roubares-me os cigarros e a nunca conseguir achar sequer um fósforo e falar-te sobre o programa da televisão que vi na noite anterior e levar-te ao oftalmologista e não rir das tuas piadas e querer-te de manhã mas deixar-te dormir um bocado e beijar-te as costas e tocar na tua pele e dizer quanto gosto do teu cabelo dos teus olhos dos teus lábios do teu pescoço dos teus peitos do teu rabo do teu ________ e sentar-me nos degraus a fumar até o teu vizinho chegar a casa e se sentar nos degraus a fumar até tu chegares a casa e preocupar-me quando estás atrasada e ficar surpreendido quando chegas cedo e dar-te girassóis e ir à tua festa e dançar até ficar todo negro e pedir desculpa quando estou errado e ficar feliz quando me desculpas e olhar para as tuas fotografias e desejar ter-te conhecido desde sempre e ouvir a tua voz no meu ouvido e sentir a tua pele na minha pele e ficar assustado quando estás zangada e um dos teus olhos vermelho e o outro azul e o teu cabelo para a esquerda e o teu rosto para oriente e dizer-te que és lindíssima e abraçar-te quando estás ansiosa e amparar-te quando estás magoada e querer-te quando te cheiro e ofender-te quando te toco e choramingar quando estou ao pé de ti e choramingar quando não estou e babar-me para o teu peito e cobrir-te à noite e ficar frio quando me tiras o cobertor e quente quando não o fazes e derreter-me quando sorris e desintegrar-me quando te ris e não compreender porque é que pensas que eu te estou a deixar quando eu não te estou a deixar e pensar como é que tu podes achar que eu alguma vez te podia deixar e pensar quem tu és mas aceitar-te na mesma e contar-te sobre o rapaz da floresta encantada de árvores-anjo que voou por cima do oceano porque te amava e escrever-te poemas e pensar porque é que tu não acreditas em mim e ter um sentimento tão profundo que para ele não existem palavras e querer comprar-te um gatinho do qual teria ciúmes porque teria mais atenção que eu e atrasar-te na cama quando tens de ir e chorar como um bebé quando finalmente vais e ver-me livre das baratas e comprar-te prendas que tu não queres e levá-las de volta outra vez e pedir-te em casamento e tu dizeres não outra vez mas eu continuar a pedir-te porque embora tu penses que eu não estou a falar a sério eu estou mesmo a falar a sério desde a primeira vez que te pedi e vaguear pela cidade pensando que ela está vazia sem ti e querer aquilo que queres e achar que me estou a perder mas saber que estou seguro contigo e contar-te o pior que há em mim e tentar dar-te o meu melhor porque não mereces menos e responder às tuas perguntas quando deveria não o fazer e dizer-te a verdade quando na verdade não o quero e tentar ser honesto porque sei que preferes assim e pensar que acabou tudo mas ficar agarrado a apenas mais dez minutos antes de me atirares para fora da tua vida e esquecer-me de quem eu sou e tentar chegar mais perto de ti porque é maravilhoso aprender a conhecer-te e vale bem o esforço e falar mau alemão contigo e pior ainda em hebreu e fazer amor contigo às três da manhã e de alguma maneira de alguma maneira de alguma maneira transmitir algum do esmagador, imortal, irresistível, incondicional, abrangente, preenchedor, desafiante, contínuo e infindável amor que tenho por ti.
Sarah Kane
Sarah Kane
terça-feira, julho 14, 2009
No fim de contas são poucas as palavras
que nos doem de verdade, e muito poucas
as que conseguem alegrar a alma.
E são também muito poucas as pessoas
que nos fazem bater o coração, e menos
ainda com o correr do tempo.
No fim de contas, são pouquíssimas as coisas
que na verdade importam nesta vida:
poder amar alguém e ser amado,
não morrer depois dos nossos filhos.
Amalia Bautista
que nos doem de verdade, e muito poucas
as que conseguem alegrar a alma.
E são também muito poucas as pessoas
que nos fazem bater o coração, e menos
ainda com o correr do tempo.
No fim de contas, são pouquíssimas as coisas
que na verdade importam nesta vida:
poder amar alguém e ser amado,
não morrer depois dos nossos filhos.
Amalia Bautista
sábado, julho 11, 2009
sexta-feira, julho 10, 2009
quinta-feira, julho 09, 2009
quarta-feira, julho 08, 2009
terça-feira, julho 07, 2009
tradução caseira da lebre
Em que parte do corpo se situa o medo? Em que parte se multiplica? No centro do peito? No nascimento da garganta vai descendo até ao estômago, demora-se nas pernas, de preferência nos joelhos, e chega até aos pés, sobe de novo e castiga os braços, põe-lhe luvas nas mãos e um corpete ajustadíssimo no peito. Eu aconselharia não consultar nenhum espelho quando o medo põe a mão na garganta. A supressão do medo causa estragos.
Silvina Ocampo
Em que parte do corpo se situa o medo? Em que parte se multiplica? No centro do peito? No nascimento da garganta vai descendo até ao estômago, demora-se nas pernas, de preferência nos joelhos, e chega até aos pés, sobe de novo e castiga os braços, põe-lhe luvas nas mãos e um corpete ajustadíssimo no peito. Eu aconselharia não consultar nenhum espelho quando o medo põe a mão na garganta. A supressão do medo causa estragos.
Silvina Ocampo
domingo, julho 05, 2009
Etiquetas: os galos de barcelos da lebre
sexta-feira, julho 03, 2009
É claro que uma pessoa apesar de tudo tem de se adaptar. Dê lá por onde der. Disso ninguém se safa. Atenção, adaptar-se não quer dizer pores-te logo a pensar de uma maneira diferente daquela que costumas pensar. Para te adaptares começas por reprimir os pensamentos. É como com os sonhos ou com os desejos, é possível a gente viver na sociedade, a sociedade até nos pode oferecer uma ou outra coisa. Tens é de saber ao que vais renunciar. Não se pode ter tudo, é óbvio. E se se pudesse também era demais, não era? No fundo, sabes, tu és responsável por tudo, se levantas a mão, és responsável por isso, ou quando falas, és responsável. És responsável por tudo.
Rainer Werner Fassbinder
Rainer Werner Fassbinder