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terça-feira, setembro 30, 2008

doem-me os vazios nas palmas das mãos

o toque das palavras usadas
só no silêncio das papoilas se ouve

como descrever o perfil do vermelho com o olhar vazio




Maria Sousa



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domingo, setembro 28, 2008

Parabéns
aos meus pais pelos 40 anos de casadosImage hosted by Photobucket.com

sábado, setembro 27, 2008

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sexta-feira, setembro 26, 2008

Manhã

Ilumino-me
de imenso.




Giuseppe Ungaretti



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quinta-feira, setembro 25, 2008

Ela gostava de tudo aquilo: da mesa da cozinha, dos pequenos bancos de madeira, das árvores que conseguia ver da janela, de uma certa pureza do ar que a obrigava a renunciar aos prazeres de adulto: aquele tempo tinha uma marca infantil. Crescera naquela casa.Mas agora acabou: estava já crescida. Como uma investigação que termina, ela sentia que chegara ao fim. Já não cresço, murmura.Não havia necessidade de não ser sincera: estava sozinha, podia dizer a verdade.



Gonçalo M. Tavares



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quarta-feira, setembro 24, 2008

Quando entre nós
só havia uma carta certa
a correspondência completa
o trem os trilhos
a janela aberta uma certa paisagem
sem pedras ou sobressaltos
meu salto alto
em equilíbrio
o copo d’água
a espera do café



ana cristina césar



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terça-feira, setembro 23, 2008

Estragas-me a paz.
e eu preciso das minhas solidões,
de bocados mentais sem ti.

Começo a ser doença obsessiva
ao repetir-me por poemas isto:
as tuas invasões à minha paz.
(Podia até em jeito original
por aqui umas notas sobre ti:
cf., vide: textos tal e tal)
Mas é que a minha paz fica toda es-
tragada quando te penso amor.

Interrompi os versos por laranjas.
E volto sempre a ti mesmo que não.
É estranho que pacíficas laranjas
não me consigam afastar de ti.



Ana Luísa Amaral



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sábado, setembro 20, 2008

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sexta-feira, setembro 19, 2008

não estou certo de nada. gostava, contudo,
de acreditar que existes, para te esperar sem
angústia, talvez pôr a música mais baixo, ouvir
os vizinhos a conversar, preparar coisas para te
dizer, ler um livro, vestir-me. gostava de ter
por ti um amor convencional, sem ter de o
imaginar. com um jantar pelo meio, um passeio
no mais popular do parque, a ver cisnes e a
fugir dos cavalos. mas não estou certo de nada, e
mais fácil é fechar as portadas, escolher um cobertor
quente e fazer com que vente mais e mais lá fora



valter hugo mãe



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quinta-feira, setembro 18, 2008

De vez em quando a insónia vibra com a nitidez dos sinos, dos cristais. E então, das duas uma: partem-se ou não se partem as cordas tensas da sua harpa insuportável.No segundo caso, o homem que não dorme pensa: «o melhor é voltar-me para o lado esquerdo e assim, deslocando todo o peso do sangue sobre a metade mais gasta do meu corpo, esmagar o coração».



Carlos de Oliveira



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quarta-feira, setembro 17, 2008

Duas linhas de amor,
a minha escrita
a falhar contra o vento
Antes de tudo, igual a tudo,
os fantasmas persistem,
sonolentos
Noite após noite,
abandonam o quarto em acalmia
e trocam de vestido
Põem de lado o branco
o sol,
e de negro enfeitados
para na noite
de novo proceder ao massacre
Até à madrugada,
quando o sono: mais forte
e esse lado do espelho
os acolhe outra vez




Ana Luísa Amaral



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terça-feira, setembro 16, 2008

" Não posso acreditar", disse Alice.
" Ai não?", perguntou a Rainha Branca em tom condoído.
" Tenta outra vez; inspira fundo e fecha os olhos."
Alice riu, " Não vale a pena tentar", disse: "Uma pessoa não pode acreditar em coisas impossíveis. " Atrevo-me a dizer que não tens muita prática ", disse a Rainha. " Quando tinha a tua idade, fazia sempre isso meia hora por dia. Ora, cheguei a acreditar em seis coisas impossíveis antes do pequeno-almoço."



Lewis Carroll



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sábado, setembro 13, 2008

sexta-feira, setembro 12, 2008

É isto. Ouve com atenção. Meditei sobre o amor, e esclareci tudo. Vi claramente o que está errado. Os homens apaixonam-se pela primeira vez. E por quem se apaixonam eles?
A boca macia do garoto estava entreaberta; e o rapaz não respondeu.
- Por uma mulher -- disse o velho. -- Sem ciência, sem nada que os sustente, entregam-se à experiência mais perigosa e sagrada desta terra de Deus. Apaixonam-se por uma mulher. Não é isto verdade, meu filho?
- É... -- respondeu murmuradamente o rapaz.
- Começam pelo lado errado do amor. Começam pelo mais alto. É para admirar a tão grande miséria resultante? Sabes como os homens deveriam amar?
O velho estendeu a mão e agarrou o rapaz pela gola da blusa de couro. Sacudiu-o suavemente, e os olhos verdes olhavam sem pestanejar, graves.
- Meu filho, sabes como o amor devia começar?
O rapaz sentia-se pequeno no banco, todo ouvidos, imóvel. E, devagar, abanou a cabeça. O velho chegou-se mais e segredou:

- Uma árvore. Um rochedo. Uma nuvem.


Carson McCullers



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obrigada miguel

quinta-feira, setembro 11, 2008

Cada batida do coração arrasta mais sangue. Não adianta descalçar os sapatos nem o gemido os abriga desse líquido espesso escorrendo pelas pernas. Nem mesmo. Nem mesmo vivemos algo semelhante a um romance vitoriano. Somente este não-sono profundo e forçado, o medo pisando folhas caídas sob o céu azul.



Ana Marques Gastão



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quarta-feira, setembro 10, 2008

tradução caseira da lebre



Um pequeno período de tempo pode significar anos na vida duma pessoa. Uma pessoa apenas sabe o que sabe, e o tempo pode parecer muito ou pouco de acordo com a quantidade de espaço que ocupa agora no coração e mente duma pessoa. De acordo com isto, o tempo que eu tenho vivido nesta casa é assim permanente, e é por isso que eu me posso chamar, que eu posso ser, que eu sou velha.
A história está toda amontoada atrás de mim: o que eu sei que as outras pessoas fazem ou têm feito, tudo categorizado, amontoado, os factos da vida, e as ocorrências, destruídas pelos falhanços, pelo aumentar constante de problemas que acontecem e aconteceram, de vida documentadas ou esquecidas, ou as duas coisas, ou pior, recordadas e inúteis. Inúteis? Falhadas? Que raio quero eu dizer com isto?



Lucy Corin



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terça-feira, setembro 09, 2008

Faz de conta que ela era uma princesa azul pelo crepúsculo que viria, faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos, faz de conta que uma veia não se abrira e faz de conta que sangue escarlate não estava em silêncio branco escorrendo e que ela não estivesse pálida de morte, estava pálida de morte mas isso fazia de conta que estava mesmo de verdade, precisava no meio do faz-de-conta falar a verdade de pedra opaca para que contrastasse com o faz-de-conta verde cintilante de olhos que vêem, faz de conta que ela amava e era amada, faz de conta que não precisava morrer de saudade, faz de conta que estava deitada na palma transparente da mão de Deus, faz de conta que vivia e que não estivesse morrendo pois viver afinal não passava de se aproximar cada vez mais da morte, faz de conta que ela não ficava de braços caídos quando os fios de ouro que fiava se embaraçavam e ela não sabia desfazer o fino fio frio, faz de conta que era sábia bastante para desfazer os nós de marinheiros que lhe atavam os pulsos, faz de conta que tinha um cesto de pérolas só para olhar a cor da lua, faz de conta que ela fechasse os olhos e os seres amados surgissem quando abrisse os olhos úmidos da gratidão mais límpida, faz de conta que tudo o que tinha não era de faz-de-conta, faz de conta que se descontraíra o peito e a luz dourada a guiava pela floresta de açudes e tranqüilidade, faz de conta que ela não era lunar, faz de conta que ela não estava chorando.



Clarice Lispector



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sábado, setembro 06, 2008

lá em cimaPhotobucket

sexta-feira, setembro 05, 2008

faz hoje oito dias passei a tarde no quarto
arrumando sentimentos (telefonemas
demorados caixotes de canto cheiíssimos)

o que trouxe a chave de casa as portas
do primeiro beijo. no outono caem as
folhas da estante e os livros ficam nus

solto uma fotografia entre o armário e
a parede investindo na surpresa de te
encontrar por acaso na próxima arrumação
do quarto. traço círculos a vermelho

no calendário de parede (sem pressa
de consultar os riscos dentro da mão)
os gatos sempre se deitam sobre o papel
mais necessário



João Luís Barreto Guimarães



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quinta-feira, setembro 04, 2008

Este Verão ensina-me
a amar as minhas cicatrizes
a enfeitar-me com marcas de estrangulamento no pescoço

Este Verão ensina-me
a fechar à chave a amargura e fico
bem roliça e anafada pareço bem tratada

Este Verão ensina-me
a gritar o bel canto

Este Verão ensina-me
que a solidão descansa
e cresce numa mão

Este Verão ensina-me
a não confundir um corpo disponível
com o desejo de felicidade

Este Verão ensina-me
a ser para cada pedra um espelho de água

Este Verão ensina-me
a amar grandes bolas de sabão e pequenas
antes de rebentarem

Este Verão ensina-me
que tudo sem nós
por si continua

Este Verão ensina-me
um rosto gelado feliz

Este Verão ensina-me
tenho que ser eu a bater no tambor
quando quiser dançar

este Verão ensina-me
a ser sem felicidade sem tristeza por uns
segundos aliada de Deus

Este Verão ensina-me
a acordar de manhã. Grata. Sozinha.

Este Verão ensina-me
que a folha do limoeiro só deita cheiro
quando a desfazemos entre os dedos.



Ulla Hahn



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quarta-feira, setembro 03, 2008

chegas a casa com as mãos
cheias de sacos e vincadas
pelo esforço. o silêncio é escuro
antes de acenderes a luz; depois
o silêncio é o mesmo, mas ilumina
a solidão nos objectos da casa. largas tudo
logo à entrada. acendes a luz fria da casa
de banho. pegas no elástico, agarras os
cabelos, escuros. e lavas o rosto. ele
vai ficando na água. até que o faças
escorrer pelo ralo: sem nenhum som.



bruno béu



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terça-feira, setembro 02, 2008

tradução caseira da lebre


Falo como em mim se fala. Não a minha voz destinada a parecer uma voz humana mas sim a outra que testemunha que não deixei de morar no bosque.



Alejandra Pizarnik



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