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quarta-feira, agosto 24, 2016

PRÓLOGO

A poesia é para se ser livre. Não é estanque. Não existem academias ou falsas humildades. Falsas volúpias. Não está na escola ser-se o que não se é. Não devia. O útero do papel no limite, não é formal. É gravidez. É Luz. A liberdade não é, portanto, formal. É digna mas não é formal. E este útero de que falo, é livre. Os poemas, a escrita, estão sempre correctos desde que se pareçam com borboletas passando as asas na nossa pele. A poesia é uma borboleta. Atentíssima. Está na origem dos jardins, da fruta quieta na árvore, das flores desassossegadas. Está na liberdade do voo dos pássaros. Não termina nunca. O fim do mundo é, só por si, um poema lindo. É para se ser livre. Para se ter espaço. A poesia não analisa nada. Realiza, constrói e destrói. Mata. Estrelas a mais barrando a subida – pouca gente lhe chega. A minha posição em relação a ela, é a de um animal submisso. Ela toca-me e abro as mãos, estendo os braços. Abro os olhos. Sou a águia. Vejo tudo. Respiro. Voo. Caço. É para ser livre. Ela caminha soberba. Não é o paraíso. A poesia é a mais ilustre e verdadeira ave de rapina.



Patrícia Baltazar



  photo Joel Meyerowitz.jpg

terça-feira, agosto 09, 2016

Axioma: Tu és o mar
as tuas pálpe
bras curvam-se sobre o caos.

as minhas mãos
onde te tocam, criam
pequenas ilhas habitadas

em breve tu serás
todo terra: uma terra
conhecida, um país.




Margaret Atwood
tradução minha



 photo ANNETTE PEHRSSON222.jpg

terça-feira, agosto 02, 2016

ACEITAR A PERDA


Estou a morrer e ninguém me diz se por desuso
ou educado
esquecimento.
Para onde, em segredo
deserto.
Ouve: quem sou?
O que é um poeta? Uma criança,
filha
da rima
a quem se diz não fales com a boca cheia? Tira os cotovelos
de cima da mesa?
Tantas palavras. Muitas são as que não distingo.
Branco,
por exemplo.
Embora escute branco como a neve,
uma mortalha,
o leite: Acaso, branca, a fome masculina
do teu seio
também? — Pensava que o desejo era branco.
Mas branco, branco, terrivelmente branco,
apenas o olhar
que vendo se vê demasiado
e em pura crueldade
e indiferença,
ó morte — única mãe.



Eduarda Chiote



 photo Aino_Kannisto2.jpg