quarta-feira, outubro 31, 2007
terça-feira, outubro 30, 2007
a maggie , o gi e a Cristina mandaram e eu respondo
Tenho muitas vezes esta sensação com ele - uma miserável pequena boa natureza servil dominada por outra má e ruim.
5ª linha da página 161 do Coleccionador de John Fowles
The Collector, William Wyler
passo a marta , menina tóxica , miguel , marta
regulamento:
(editado)
1. Pegue no livro mais próximo, com mais de 161 páginas – implica aleatoriedade, não tente escolher o livro;
2. Abra o livro na página 161;
3. Na referida página procurar a 5.ª frase completa;
4. Transcreva na íntegra para o seu blogue a frase encontrada;
Tenho muitas vezes esta sensação com ele - uma miserável pequena boa natureza servil dominada por outra má e ruim.
5ª linha da página 161 do Coleccionador de John Fowles
The Collector, William Wyler
passo a marta , menina tóxica , miguel , marta
regulamento:
(editado)
1. Pegue no livro mais próximo, com mais de 161 páginas – implica aleatoriedade, não tente escolher o livro;
2. Abra o livro na página 161;
3. Na referida página procurar a 5.ª frase completa;
4. Transcreva na íntegra para o seu blogue a frase encontrada;
Mulher à janela
Está afundada na sua janela
contemplando as brasas do anoitecer, ainda possível.
Tudo se consumou no seu destino, inalterável a partir de agora,
tal como o mar num quadro,
e no entanto o céu continua a passar com as suas angélicas procissões.
Nenhum pato selvagem interrompeu o voo para oeste;
lá longe continuarão a florescer as ameixoeiras brancas, como se nada fosse,
e alguém há-de erguer a sua casa algures
sobre a poeira e o fumo de outra casa.
Inóspito este mundo.
Áspero este lugar de nunca mais.
Por uma fissura do coração sai um pássaro negro e é noite
-ou será um deus caído agonizando sobre o mundo?-,
mas ninguém o viu, ninguém sabe,
nem aquele que acredita que dos laços desfeitos nascem asas belíssimas,
os nós instantâneos do acaso, a aventura imortal,
embora cada pegada encerre com um selo todos os paraísos prometidos.
Ela ouviu em cada passo a condenação.
Agora não é mais do que uma mulher imóvel, alheada, na sua janela,
a simples arquitectura da sombra asilada na sua pele,
como se alguma vez uma fronteira, um muro, um silêncio, um adeus,
tivessem sido o verdadeiro limite,
o abismo final entre uma mulher e um homem.
Olga Orozco
Está afundada na sua janela
contemplando as brasas do anoitecer, ainda possível.
Tudo se consumou no seu destino, inalterável a partir de agora,
tal como o mar num quadro,
e no entanto o céu continua a passar com as suas angélicas procissões.
Nenhum pato selvagem interrompeu o voo para oeste;
lá longe continuarão a florescer as ameixoeiras brancas, como se nada fosse,
e alguém há-de erguer a sua casa algures
sobre a poeira e o fumo de outra casa.
Inóspito este mundo.
Áspero este lugar de nunca mais.
Por uma fissura do coração sai um pássaro negro e é noite
-ou será um deus caído agonizando sobre o mundo?-,
mas ninguém o viu, ninguém sabe,
nem aquele que acredita que dos laços desfeitos nascem asas belíssimas,
os nós instantâneos do acaso, a aventura imortal,
embora cada pegada encerre com um selo todos os paraísos prometidos.
Ela ouviu em cada passo a condenação.
Agora não é mais do que uma mulher imóvel, alheada, na sua janela,
a simples arquitectura da sombra asilada na sua pele,
como se alguma vez uma fronteira, um muro, um silêncio, um adeus,
tivessem sido o verdadeiro limite,
o abismo final entre uma mulher e um homem.
Olga Orozco
segunda-feira, outubro 29, 2007
sábado, outubro 27, 2007
quinta-feira, outubro 25, 2007
podes levar os dias que trouxeste
os pássaros soterraram agosto
e sem lugar um homem cega pela janela
o mar que jura ter tocado com o sangue
podia ter sido o amor se não tivesse vindo
tão directamente da sede
um duplo rosto de enganos e os braços
que saíram desertos
o eco da morte reverbera na pele
com que vejo a tua ausência encher as ruas
um choro de papel cai pela terra
e nunca foi tão tarde ser depois
daqui onde o grito surdo incendeia
a refutação da madrugada
donde o crânio esmaga o coração
um homem corta pela janela
a própria certeza de ter sido
não é tarde demais para uma manhã
que foi a enterrar em tantas noites
as escadas morreram de sede
a terra caiu em nunca
podes levar os dias que trouxeste
Pedro Sena-Lino
os pássaros soterraram agosto
e sem lugar um homem cega pela janela
o mar que jura ter tocado com o sangue
podia ter sido o amor se não tivesse vindo
tão directamente da sede
um duplo rosto de enganos e os braços
que saíram desertos
o eco da morte reverbera na pele
com que vejo a tua ausência encher as ruas
um choro de papel cai pela terra
e nunca foi tão tarde ser depois
daqui onde o grito surdo incendeia
a refutação da madrugada
donde o crânio esmaga o coração
um homem corta pela janela
a própria certeza de ter sido
não é tarde demais para uma manhã
que foi a enterrar em tantas noites
as escadas morreram de sede
a terra caiu em nunca
podes levar os dias que trouxeste
Pedro Sena-Lino
quarta-feira, outubro 24, 2007
terça-feira, outubro 23, 2007
Dei um passeio
Passei por uma esquina. Não gosto de passear em vão, só vou se
precisar mesmo de alguma coisa. Ver o que há para ver, despachar o
assunto, mas andar por andar, não ando. Só por andar, isso não.
E também não gosto de quebrar nada. Hoje caminhei um pouco ate a
esquina, depois regressei, continuei a caminhar, depois voltei para casa,
fui ate a cozinha, tirei um copo do armário, não me perdi, tirei-o e
lancei-o para o chão. Não faço cenas. Primeiro segurei-o, mas logo o
deixei cair. Tudo isto aconteceu hoje. O som ecoou muito longe.
Endre Kukorelly
Passei por uma esquina. Não gosto de passear em vão, só vou se
precisar mesmo de alguma coisa. Ver o que há para ver, despachar o
assunto, mas andar por andar, não ando. Só por andar, isso não.
E também não gosto de quebrar nada. Hoje caminhei um pouco ate a
esquina, depois regressei, continuei a caminhar, depois voltei para casa,
fui ate a cozinha, tirei um copo do armário, não me perdi, tirei-o e
lancei-o para o chão. Não faço cenas. Primeiro segurei-o, mas logo o
deixei cair. Tudo isto aconteceu hoje. O som ecoou muito longe.
Endre Kukorelly
segunda-feira, outubro 22, 2007
sábado, outubro 20, 2007
sexta-feira, outubro 19, 2007
A manhã com as suas proibições
na tua fala. A claridade estava a crescer
numa cama que já se tinha atravessado no escuro
como uma nave enfileirando para a guerra.
Eu não tinha ficado para conhecer a vista
das tuas janelas: imaginava um pátio riscado por ervas
mas não cheguei a levantar as persianas.
Talvez fosse um sítio ao qual não se pudesse regressar
porque quando falávamos os nossos olhos não coincidiam
com nenhuma palavra.
Teria gostado de te levar comigo outra vez
mas era difícil recuperar as razões
para o desejo. E no caso de nos ter acontecido uma mudança
onde é que havíamos de procurar
os seus indícios? Estavas a dar de comer aos peixes
e eu só falava em livros.
Rui Pires Cabral
na tua fala. A claridade estava a crescer
numa cama que já se tinha atravessado no escuro
como uma nave enfileirando para a guerra.
Eu não tinha ficado para conhecer a vista
das tuas janelas: imaginava um pátio riscado por ervas
mas não cheguei a levantar as persianas.
Talvez fosse um sítio ao qual não se pudesse regressar
porque quando falávamos os nossos olhos não coincidiam
com nenhuma palavra.
Teria gostado de te levar comigo outra vez
mas era difícil recuperar as razões
para o desejo. E no caso de nos ter acontecido uma mudança
onde é que havíamos de procurar
os seus indícios? Estavas a dar de comer aos peixes
e eu só falava em livros.
Rui Pires Cabral
quinta-feira, outubro 18, 2007
Ofélia
Quem dorme amorosamente cadáver na
cama de flores sobre esta água sombria
grave e quieta não é ela (todos os
dias a vejo subindo a rua tomando
café guiando o carrinho de compras pelos
corredores do hipermercado - nenhuma
vida espera sentada o fim do espanto alheio
pois não?) mas o infeliz costume que a minha
memória tem de imitar com o alimento
que lhe dou algumas mastigações famosas.
António Gregório
Quem dorme amorosamente cadáver na
cama de flores sobre esta água sombria
grave e quieta não é ela (todos os
dias a vejo subindo a rua tomando
café guiando o carrinho de compras pelos
corredores do hipermercado - nenhuma
vida espera sentada o fim do espanto alheio
pois não?) mas o infeliz costume que a minha
memória tem de imitar com o alimento
que lhe dou algumas mastigações famosas.
António Gregório
terça-feira, outubro 16, 2007
domingo, outubro 14, 2007
sábado, outubro 13, 2007
sexta-feira, outubro 12, 2007
quinta-feira, outubro 11, 2007
Um dia os nossos gestos serão verdes.
Dormiremos aos pés da terra
nas nossas bocas só os pés da terra
e a folhagem em vez dos meus braços.
Basta um grão de pó na unha
a noite dedilhada no centro do poro
para que eu estenda os seios no deserto
depois da vindima. Entre a pele e as espigas
já não restam reticências – apenas uma escama
com que agasalho o mundo.
Catarina Nunes de Almeida
Dormiremos aos pés da terra
nas nossas bocas só os pés da terra
e a folhagem em vez dos meus braços.
Basta um grão de pó na unha
a noite dedilhada no centro do poro
para que eu estenda os seios no deserto
depois da vindima. Entre a pele e as espigas
já não restam reticências – apenas uma escama
com que agasalho o mundo.
Catarina Nunes de Almeida
quarta-feira, outubro 10, 2007
Todas as pessoas sozinhas dançam devagar na sala de espera
mesmo que o dia seja quente e convide a passeios ao luar.
A música é sempre a mesma, assobiada ao ouvido
por um rapazinho tímido e fechado do qual não se sabe o nome
e a destreza que podemos alcançar, neste querer dar o passo certo,
é apenas uma mínima ideia da força dos nossos desejos.
Todas as pessoas sozinhas sorriem em frente ao espelho
e lavam os dentes como quem arranca beijos à emoção
de ter ali, à nossa frente, alguém de quem gostamos muito.
A porta da rua é um lugar onde só se sai,
a nossa família é uma fotografia pendurada na parede
e os amigos são aqueles que nos dão bons dias no café.
Todas as pessoas sozinhas gritam baixinho os nomes esquecidos
que outras pessoas sozinhas lhes sussurraram alto uma vez,
quando ainda éramos todos uns dos outros.
Engomada a camisa, vestimo-nos com o cuidado solene
daqueles que vestem camisas com emoção e significado
enquanto esperam a hora certa para morrer ou nascer.
Todas as pessoas sozinhas todas as pessoas sozinhas
embrulhadas em lençóis frescos porque é Verão
a rebolar as dores de pescoço pelas duas almofadas da cama
e a pensar que de tanto dormir assim sem ninguém
vai ser difícil voltar a adormecer só num dos cantos do colchão.
Todas as pessoas sozinhas todas as pessoas sozinhas.
Luís Filipe Cristóvão
mesmo que o dia seja quente e convide a passeios ao luar.
A música é sempre a mesma, assobiada ao ouvido
por um rapazinho tímido e fechado do qual não se sabe o nome
e a destreza que podemos alcançar, neste querer dar o passo certo,
é apenas uma mínima ideia da força dos nossos desejos.
Todas as pessoas sozinhas sorriem em frente ao espelho
e lavam os dentes como quem arranca beijos à emoção
de ter ali, à nossa frente, alguém de quem gostamos muito.
A porta da rua é um lugar onde só se sai,
a nossa família é uma fotografia pendurada na parede
e os amigos são aqueles que nos dão bons dias no café.
Todas as pessoas sozinhas gritam baixinho os nomes esquecidos
que outras pessoas sozinhas lhes sussurraram alto uma vez,
quando ainda éramos todos uns dos outros.
Engomada a camisa, vestimo-nos com o cuidado solene
daqueles que vestem camisas com emoção e significado
enquanto esperam a hora certa para morrer ou nascer.
Todas as pessoas sozinhas todas as pessoas sozinhas
embrulhadas em lençóis frescos porque é Verão
a rebolar as dores de pescoço pelas duas almofadas da cama
e a pensar que de tanto dormir assim sem ninguém
vai ser difícil voltar a adormecer só num dos cantos do colchão.
Todas as pessoas sozinhas todas as pessoas sozinhas.
Luís Filipe Cristóvão