quarta-feira, junho 29, 2005
terça-feira, junho 28, 2005
lebre em modo devorador do livro que está a ler (campo de sangue)
há frases que só fazem sentido na memória, que se perdem quando ditas em voz alta, frases que se passeiam na cabeça, frases de andar por casa.
Dulce Maria Cardoso
há frases que só fazem sentido na memória, que se perdem quando ditas em voz alta, frases que se passeiam na cabeça, frases de andar por casa.
Dulce Maria Cardoso
domingo, junho 26, 2005
À CATA DO VENTO
O cata-vento
tem obrigações legais
deve
catar o vento
portanto
quando o vento passa
diz-lhe logo atento
espera aí
preciso de te catar
mas o vento
sempre a passar
tem outras coisas
em que pensar
não está para ser
catado no ar
e vai passando
desatento
ao cata-vento
sem se importar
obrigado legalmente
a catar o vento
então
o cata-vento
senta-se no telhado
aporrinhado
e sem vento
para legalizar
o seu direito
de ser elemento
respeitado
pelos elementos
sentado no telhado
queixa-se
isto não é vida
Mário-Henrique Leiria
O cata-vento
tem obrigações legais
deve
catar o vento
portanto
quando o vento passa
diz-lhe logo atento
espera aí
preciso de te catar
mas o vento
sempre a passar
tem outras coisas
em que pensar
não está para ser
catado no ar
e vai passando
desatento
ao cata-vento
sem se importar
obrigado legalmente
a catar o vento
então
o cata-vento
senta-se no telhado
aporrinhado
e sem vento
para legalizar
o seu direito
de ser elemento
respeitado
pelos elementos
sentado no telhado
queixa-se
isto não é vida
Mário-Henrique Leiria
sexta-feira, junho 24, 2005
quinta-feira, junho 23, 2005
tinha comigo um pedaço de ti
e enquanto caminhava
cada passo evocava a tua presença
e tu estavas mais perto
de vez em quando arrancava uma memória
para passar o tempo
e sangrava muito sempre que o fazia
e um sentimento de culpa
invadia-te por dentro
e eu sentia que estavas perto
e ao mesmo tempo tão distante de mim
às vezes perco a memória da tua voz
José Rui Teixeira
e enquanto caminhava
cada passo evocava a tua presença
e tu estavas mais perto
de vez em quando arrancava uma memória
para passar o tempo
e sangrava muito sempre que o fazia
e um sentimento de culpa
invadia-te por dentro
e eu sentia que estavas perto
e ao mesmo tempo tão distante de mim
às vezes perco a memória da tua voz
José Rui Teixeira
quarta-feira, junho 22, 2005
terça-feira, junho 21, 2005
mais uma tradução em modo "caseiro"
Tenho conhecido a implacável tristeza dos lápis
arrumados nas suas caixas, dor de bloco-notas e pisa papéis
toda a miséria das pastas de argolas e da goma arábica
desolação em imaculados espaços públicos
recepções abandonadas, lavabos, central telefónica
o pathos inalterável da bacia e do cântaro
ritual de gráficos múltiplos, clips, vírgula
duplicação sem fim de vidas e objectos
e eu tenho visto pó das paredes de instituições
mais fino que farinha, vivo, mais perigoso que sílica
peneirar, quase sem se ver, por longas tardes de tédio
a espalhar uma película fina em unhas e em sobrancelhas delicadas
a esmaltar o cabelo pálido, as caras duplicadas cinzento padrão
Theodore Roethke
Tenho conhecido a implacável tristeza dos lápis
arrumados nas suas caixas, dor de bloco-notas e pisa papéis
toda a miséria das pastas de argolas e da goma arábica
desolação em imaculados espaços públicos
recepções abandonadas, lavabos, central telefónica
o pathos inalterável da bacia e do cântaro
ritual de gráficos múltiplos, clips, vírgula
duplicação sem fim de vidas e objectos
e eu tenho visto pó das paredes de instituições
mais fino que farinha, vivo, mais perigoso que sílica
peneirar, quase sem se ver, por longas tardes de tédio
a espalhar uma película fina em unhas e em sobrancelhas delicadas
a esmaltar o cabelo pálido, as caras duplicadas cinzento padrão
Theodore Roethke
domingo, junho 19, 2005
A lebre em modo passeio
Imagens, poemas vivos, encantamentos e belezas naturais, tudo isto fervilha literalmente num belo passeio, por mais pequeno que seja
É com a maior atenção e cordialidade que aquele que passeia tem que estudar e observar o mais ínfimo dos seres vivos, seja uma criança, um cão, um mosquito, uma borboleta, um pardal, um verme, uma flor, um homem, uma casa, uma sebe, um caracol, um rato, uma nuvem, uma montanha, uma folha, ou simplesmente um insignificante pedacito de papel deitado fora, onde talvez um adorável e belo pequeno aluno escreveu as suas primeiras letras desajeitadas. Tanto as coisas mais elevadas como as mais humildes, as mais sérias e as mais divertidas, têm para ele o mesmo interesse, beleza e valor.
Robert Walser
Imagens, poemas vivos, encantamentos e belezas naturais, tudo isto fervilha literalmente num belo passeio, por mais pequeno que seja
É com a maior atenção e cordialidade que aquele que passeia tem que estudar e observar o mais ínfimo dos seres vivos, seja uma criança, um cão, um mosquito, uma borboleta, um pardal, um verme, uma flor, um homem, uma casa, uma sebe, um caracol, um rato, uma nuvem, uma montanha, uma folha, ou simplesmente um insignificante pedacito de papel deitado fora, onde talvez um adorável e belo pequeno aluno escreveu as suas primeiras letras desajeitadas. Tanto as coisas mais elevadas como as mais humildes, as mais sérias e as mais divertidas, têm para ele o mesmo interesse, beleza e valor.
Robert Walser
sexta-feira, junho 17, 2005
quarta-feira, junho 15, 2005
estou completamente apaixonada por este site/diário
A felicidade sentava-se todos os dias
no peitoril da janela.
Tinha feições de menino inconsolável.
Um menino impúbere
ainda sem amor para ninguém,
gostando apenas de demorar as mãos
ou de roçar lentamente o cabelo pelas
faces humanas.
E como menino que era,
achava um grande mistério no seu próprio nome.
Jorge de Sena
A felicidade sentava-se todos os dias
no peitoril da janela.
Tinha feições de menino inconsolável.
Um menino impúbere
ainda sem amor para ninguém,
gostando apenas de demorar as mãos
ou de roçar lentamente o cabelo pelas
faces humanas.
E como menino que era,
achava um grande mistério no seu próprio nome.
Jorge de Sena
terça-feira, junho 14, 2005
Façam-me um favor, já que eu não posso ir ver esta exposição
VÃO POR MIM
Exposição de pintura de Maria João Sanches
(A Exposição estará patente ao público em Lisboa até 28 de Junho de 2005, no Edifício Central do Município - Centro de Documentação – 1º piso)
Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. (...) Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz. Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que
é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.
Cecília Meireles
VÃO POR MIM
Exposição de pintura de Maria João Sanches
(A Exposição estará patente ao público em Lisboa até 28 de Junho de 2005, no Edifício Central do Município - Centro de Documentação – 1º piso)
Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. (...) Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz. Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que
é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.
Cecília Meireles
segunda-feira, junho 13, 2005
As metáforas da boca ensinam a morrer
noutras manhãs junto das dunas ardem
os joelhos os testículos os cabelos
dizemos não dizemos foram aves
agora são em tempos de pobreza
um clarão breve antes do amanhecer.
Eugénio de Andrade
sábado, junho 11, 2005
Chega-te mais. Sei que parece
não caber um grão entre nós
e o calor que me dás cura-me
de muitos males. Mas a tua pele
é também um escudo impenetrável
e os teus ouvidos estão voltados
para dentro, mas não ouves
as mensagens que te atravessam,
não escutas nenhum de nós.
Não sei porque estamos aqui
Colados um ao outro. É verdade
que está frio, um frio que se repete
todos os dias como se fôssemos peixes
de aquário e se tivessem esquecido
de mudar a água. Andamos às voltas
no vidro redondo, vamos ficando míopes
e sujando a água. Estamos juntos
e juntos damos a volta ao circo.
Há uns quantos que nos aplaudem,
mas acho que têm tanto medo como nós
Rosa Alice Branco
não caber um grão entre nós
e o calor que me dás cura-me
de muitos males. Mas a tua pele
é também um escudo impenetrável
e os teus ouvidos estão voltados
para dentro, mas não ouves
as mensagens que te atravessam,
não escutas nenhum de nós.
Não sei porque estamos aqui
Colados um ao outro. É verdade
que está frio, um frio que se repete
todos os dias como se fôssemos peixes
de aquário e se tivessem esquecido
de mudar a água. Andamos às voltas
no vidro redondo, vamos ficando míopes
e sujando a água. Estamos juntos
e juntos damos a volta ao circo.
Há uns quantos que nos aplaudem,
mas acho que têm tanto medo como nós
Rosa Alice Branco
quarta-feira, junho 08, 2005
despir o dia quando os olhos se enrugam e
o teu corpo não tem espaço senão para palavras
que afogas nos lençóis
passas a noite a aprender que
talvez sejam elas o que envelhece no linho
na minha boca há um não te saber dizer
que há cor para além da memória
e entre as margens do lençol já gasto
há sono onde nem todos os sonhos respiram
eue
o teu corpo não tem espaço senão para palavras
que afogas nos lençóis
passas a noite a aprender que
talvez sejam elas o que envelhece no linho
na minha boca há um não te saber dizer
que há cor para além da memória
e entre as margens do lençol já gasto
há sono onde nem todos os sonhos respiram
eue
terça-feira, junho 07, 2005
sábado, junho 04, 2005
sexta-feira, junho 03, 2005
quinta-feira, junho 02, 2005
quarta-feira, junho 01, 2005
esta frase da Margaret Atwood é tão minha
everyone else my age is an adult
whereas I am merely in disguise.
everyone else my age is an adult
whereas I am merely in disguise.
apeteceu-me postar ou repostar uma das minhas primeiras traduçoes caseiras da minha Pizarnik (é também um dos meus poemas preferidos dela)
Infância
Hora em que a erva cresce
na memória do cavalo.
O vento pronuncia discursos ingénuos
em honra dos lilases,
e alguém entra na morte
com os olhos abertos
como Alice no país do já visto.
Alejandra Pizarnik
Infância
Hora em que a erva cresce
na memória do cavalo.
O vento pronuncia discursos ingénuos
em honra dos lilases,
e alguém entra na morte
com os olhos abertos
como Alice no país do já visto.
Alejandra Pizarnik