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quarta-feira, março 31, 2004

Parabéns Ju


Relógio Sem Ponteiros

Quando agora te debruças sobre a água do tanque, vês projectado, lá no fundo, um relógio sem ponteiros. Percebes, então, que a ferrugem é também uma qualidade e um atributo da água, e não apenas de alguns metais a que chamamos vis. E percebes ainda que já não são necessários os relógios. Tu já não tens idade, nem o tempo, que partilha do halo e da fluidez da água e é, às vezes, como ela, tão inodoro e insípido, se deixa prender, mesmo num vaso de cristal. E não podes, assim, medir-lhe a respiração. A sua duração, se preferes. Se alguma ainda subsiste, é a que é regulada pelos ponteiros do seu próprio corpo.

Albano Martins

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segunda-feira, março 29, 2004

Ainda Vermeer, a luz e as janelas dos quadros dele deliciam-me


É a manhã no copo;
Tempo de decifrar o mapa,
De abrir as cortinas onde o sol frio nasce,
De ler uma carta pertubadora
Que veio pela galera da China;
Até que a lição do cravo
Através dos seus cristais
Restitui a inocência.


Murilo Mendes

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"Olhou para dentro de mim..."

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sexta-feira, março 26, 2004

Pela noite à eterna dor se chega
cruel é a terra, diversa terra
quando teu rosto se esvai
e a névoa com voz de pranto
cai jamais leve sobre nós.

De breve uso, cresce no peito
uma tímida pálida alegria
precioso corpo luz, borboleta
de asas nítidas e tranquilas
que vigia o coração dos mortos.

Diz-me secretas brandas palavras
porque sou refúgio e escombro
de um vasto dia, áspero exílio
nas suaves sílabas de precisos
e curvos juncos, clarão sem sol.

Desce então pelo fulgor da luz
espírito suspenso em minhas mãos.
A espera é movimento cego.
Desce, sonâmbulo, extenso amor.


Ana Marques Gastão

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quinta-feira, março 25, 2004

"Vida intensa e breve, pensou a lebre, correndo sobre as ervas do mundo"

José Agostinho Baptista


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segunda-feira, março 22, 2004

OS TRONCOS DAS ÁRVORES

Os troncos das árvores doem-me como se fossem os meus ombros
Doem-me as ondas do mar como gargantas de cristal
Dói-me o luar como um pano branco que se rasga.

Sophia de Mello Breyner Andresen


sábado, março 20, 2004

E para que o blog nao fique abandonado durante os dias em que o computador vai para compor, aqui fica uma imagem duma cortina de pipocas deliciosa

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a minha noite brilhou em tons de blues:)


"troubled in mind, I'm blue,
But i won't be blue always .
The wind gonna rise
and blow my blues away."


Sam Chatmon

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sexta-feira, março 19, 2004

Os Primeiros Encontros

Cada momento passado juntos
Era uma celebração, uma Epifania,
Nós os dois sozinhos no mundo.
Tu, tão audaz, mais leve que uma asa,
Descias numa vertigem a escada
A dois e dois, arrastando-me
Através de húmidos lilases, aos teus domínios
Do outro lado, passando o espelho.

Pela noite concedias-me o favor,
Abriam-se as portas do altar
E a nossa nudez iluminava o escuro
À medida que genufletia. E ao acordar
Eu diria “Abençoada sejas!”
Sabendo como pretenciosa era a benção:
Dormias, os lilases tombavam da mesa
Para tocar-te as pálpebras num universo de azul,
E tu recebias esse sinal sobre as pálpebras
Imóveis, e imóvel estava a tua mão quente.

Rios palpitantes por dentro do cristal,
A montanha assomando na bruma, mar enfurecido,
E tu com a bola de cristal nas mãos,
Sentada num trono enquanto dormes,
— Deus do céu! — tu pertences-me.
Acordas para transfigurar
As palavras de todos os dias,
E o teu discorrer transbordante
De poder revela na palavra “tu”
o seu novo sentido: significa “rei”.
Simples objectos transfigurados,
Tudo — a bacia, o jarro —, tudo
Uma vez de sentinela entre nós
Se torna límpido, laminar e firme.

Íamos, sem saber para onde,
Perseguidos por miragens de cidades
Derrotadas construídas no milagre,
Hortelã pimenta aos nossos pés,
As aves acompanhando-nos o voo,
E no rio os peixes á procura da nascente;
O céu, a nós se abrindo.
Porque o destino seguia-nos o rastro
Como um louco com uma navalha na mão.

Arsesii Tarkovskii

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quinta-feira, março 18, 2004

A púrpura dos dias

falar-te-ei de como se erguem
em flor as sementes,
de como o luar pode desfalecer
a solidão de um nome
e atirar-nos para o lugar das mãos

ao longe a púrpura dos dias,
do ar respirado, da vida
que não pára de bater
em cada grão de terra
- nas tuas mãos, o meu
coração de lã e o frio
que não mais te tocará
por ser possível ser feliz

Vasco Gato


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segunda-feira, março 15, 2004

VIAJE

Hoy me mira la luna
blanca y desmesurada.

Es la misma de anoche,
la misma de mañana.

Pero es otra, que nunca
fue tan grande y tan pálida.

Tiemblo como las luces
tiemblan sobre las aguas.

Tiemblo como en los ojos
suelen temblar las lágrimas.

Tiemblo como en las carnes
sabe temblar el alma.

¡Oh! la luna ha movido
sus dos labios de plata.

¡Oh! la luna me ha dicho
las tres viejas palabras:

«Muerte, amor y misterio...»
¡Oh, mis carnes se acaban!

Sobre las carnes muertas
alma mía se enarca.

Alma —gato nocturno—
sobre la luna salta.

Va por los cielos largos
triste y acurrucada.

Va por los cielos largos
sobre la luna blanca.

Alfonsina Storni

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domingo, março 14, 2004

work in progress

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