No entanto hei-de falar-vos delas um dia, se me lembrar, se puder, das minhas estranhas dores, em pormenor, distinguindo entre os diferentes géneros, para maior clareza, as do entendimento, as do coração ou afectivas, as da alma (mais bonitas não há) e finalmente as do corpo propriamente dito, primeiro as internas ou latentes, depois as da superfície, começando pelo cabelo e couro cabeludo e descendo metodicamente, sem pressas, até aos adorados pés, lugar dos calos, cãibras, frieiras, joanetes, unhas encravadas, pústulas, gangrena, pé boto, pé de pato, pé-de-galo, pé-de-cabra, pé chato, pé de atleta e outras bizarrias. E, aos que tiverem a gentileza de me ouvir, falarei também, na mesma ocasião, de acordo com um sistema inventado já não me lembro por quem, daqueles instantes em que, sem se estar drogado, nem bêbado, nem em êxtase, não se sente nada.
Samuel Beckett
Samuel Beckett
6 Comments:
nada, é peixe
que bem que soube reler este pedacinho :)
e nesses instantes
(um) suspiro
como agora
investiga sobre um senhor chamado edward bond... conheces ??
WWW.MOTORATASDEMARTE.BLOGSPOT.COM
Estas estranhas dores...
Bjo :)
brutal este texto.
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