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sexta-feira, outubro 31, 2008

desenha com a ponta dos teus dedos
as fronteiras exactas do meu rosto
as rugas os sinais a cicatriz que ficou da infância
o lento sulco das lâminas onde no peito
se enterra o mistério do amor

e diz-me
o que de mim amaste noutros corpos
noutras camas noutra pele

prometo que não choro mas repete
as palavras um dia minhas que sem querer
misturaste nas tuas e levaste
com as chaves de casa e os documentos do carro
- e largaste sobre a mesa com o copo de gin a meio
na primeira madrugada em que me esqueceste



Alice Vieira



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quinta-feira, outubro 30, 2008

para não te perderes pensas
em deixar marcas pelo caminho
guiar-te pelo barulho dos carros

todos os dias fazes a mala
e improvisas mapas com o lápis

viagens para o muito longe

mas continuas sentada na sala
e os únicos caminhos são
rastos de migalhas e lágrimas

é à sua sombra que vais continuar
a usar o lápis vermelho

e as árvores lá fora são apenas
pontos sem nome marcados
a verde no mapa



Maria Sousa



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terça-feira, outubro 28, 2008

tradução caseira da lebre



a vida brinca na praça
com o ser que nunca fui

e aqui estou

dança pensamento
na corda do meu sorriso

e todos dizem que isto passou e é
vai passando
vai passando
o meu coração abre a janela

vida aqui estou

a minha vida
o meu sangue só e hirto
fere no mundo

mas quero saber-me viva
mas não quero falar
de morte
nem das suas estranhas mãos



Alejandra Pizarnik



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domingo, outubro 26, 2008

sexta-feira, outubro 24, 2008

amanhã vou afundar-me no outono
passar para além do reflexo do espelho
a palavra que se dissolve na respiração

onde está o coração? é como metáfora do
silêncio que ocupa o teu lugar

e eu estou no meio de um mapa de medos
a cruzar imagens para definir a estrutura da memória



maria sousa



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quarta-feira, outubro 22, 2008

o modo súbito de ficar parada
quando às vezes há soluços no avesso da voz
aperto as mãos para dar cor à pele

sem te saber perguntar pela ausência
se estivesses aqui,
como quem fala do tempo,
não te iria dizer que
por cima da voz há relâmpagos



maria sousa



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terça-feira, outubro 21, 2008

Os meus sentimentos deviam guarda-los, ainda lhe podiam fazer falta, e a mim não me serviam de nada, devia tê-lo aconselhado a guardar os sentimentos, nunca sabemos quando precisamos dos sentimentos, da latinha de fermento que está há anos na despensa, da camisola de lã que não é vestida há mais de cinco Invernos, nunca se sabe quando precisamos de coisas mesmo se nunca as utilizamos, não fosse essa incerteza e punha um anúncio no jornal, vendem-se sentimentos, estado impecável, como novos, oportunidade única, motivo mudança de vida, bom preço



Dulce Maria Cardoso



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segunda-feira, outubro 20, 2008

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com textos de:
Alexandre Borges, Ana M. P. Antunes, António Ramos Pereira, Beatriz Hierro Lopes, Cláudia Santos Silva, Daniel Abrunheiro, David Teles Pereira, Diogo Vaz Pinto, Fernando Esteves Pinto, Hugo Roque, José Carlos Barros, Maria Sousa, Pedro Jordão, Rui Miguel Ribeiro, Sara F. Costa, Sérgio Lavos

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sábado, outubro 18, 2008

muito obrigada

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sexta-feira, outubro 17, 2008

Vamos fazer limpeza, mas geral
e vamos deitar fora as coisas todas
que não nos servem para nada, essas
coisas que não usamos já e essas
que nada fazem mais que apanhar pó,
as que evitamos encontrar porquanto
nos trazem as lembranças mais amargas,
as que nos fazem mal, enchem espaço
ou não quisemos nunca ter por perto.
vamos fazer limpeza, mas geral,
talvez melhor ainda uma mudança
que nos permita abandonar as coisas
sem sequer lhes tocar, sem nos sujarmos,
que fiquem onde sempre têm estado;
vamos embora só nós, vida minha,
para voltar a acumular de novo.
Ou vamos deitar fogo ao que nos cerca
e ficarmos em paz com essa imagem
do braseiro do mundo face aos olhos
e com o coração desabitado.




amalia bautista



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quinta-feira, outubro 16, 2008

era uma vez um blog
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quarta-feira, outubro 15, 2008

o Alice faz 6 anos.


Come in
Well, well, well, look who's here!
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terça-feira, outubro 14, 2008

À sua volta vê os seus móveis que, de acordo com os seus gostos e os seus meios, são como os quis para a sua comodidade. E eles exalam em redor o doce conforto familiar, animados como são por todas as suas recordações: já não são coisas mas como que partes íntimas de você mesmo, nas quais pode tocar e sentir aquela que parece ser a realidade tranquila da sua existência. Quer sejam faia, nogueira ou abeto, os seus moveis têm, como as recordações da sua intimidade doméstica, o sabor daquele hálito particular que germina em toda a casa e que dá à nossa vida um odor que se sente mais quando nos falta, isto é, quando se sente um cheiro diferente, mal se entra numa outra casa.



Luigi Pirandello



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sábado, outubro 11, 2008

quinta-feira, outubro 09, 2008

conheço bem a história do que há à minha volta
falo dos mesmos gestos, da mesma cama, do mesmo quarto

sabes o que te posso dar?
se te quero tocar, onde começo e onde acabo?

estou dispersa num inventário
deixado ao acaso

vem isto a propósito de não te ter
numa linguagem que não tenha lágrimas
mais do que isso
é esquecer que tenho os olhos vazios



maria sousa



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O processo de contar histórias é sempre lento
começa-se pelo inicio
e há quem diga que chegar ao fim é simples

uma frase é a melhor medida
para juntar os fragmentos

e se a noite a subir pela voz
é um método de fazer silêncios
e o coração é um órgão que
espreita pelos buracos da gramática

no fundo é porque têm um corpo como fronteira



maria sousa



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quarta-feira, outubro 08, 2008

Um outro assunto isento
queria aqui deixar.
Por exemplo.
Levanto-me cedo, tomo o pequeno almoço
fumo um cigarro, ou quantos?

Depois de pronta desço
das escadas os três lanços.
E logo em baixo café, tabaco, jornais.
Inusitado no poema –
queriam um lírio, uma açucena –
e não coisas tão banais?



Helga Moreira



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terça-feira, outubro 07, 2008

tradução caseira da lebre


O que é a realidade?
Sou uma boneca de gesso, eu poso
com olhos que abrem sem horizonte ou anoitecer
para pessoas envernizadas a sorrir,
olhos que abrem e fecham, azuis aço.
Sou uma espécie de transplante de I . Magnin?
Tenho cabelo, anjo preto,
recheio de anjo-preto para pentear,
pernas de nylon, braços luminosos
e algumas roupas dos anúncios.

Vivo numa casa de bonecas
com quatro cadeiras,
uma mesa de imitação, um telhado plano
e uma grande porta de entrada.
Muitos chegaram a esta encruzilhada tão pequena.
Há uma cama de ferro,
(a vida alarga, a vida faz pontaria)
um chão de cartão,
janelas que se escancaram para a cidade de alguém,
e pouco mais.

Alguém brinca comigo,
planta-me numa cozinha toda eléctrica
Foi isto que a Sra. Rombauer disse?
Alguém finge comigo -
estou emparedada em sólido pelo seu barulho -
uu põem-me em cima da sua cama arrumada.
Eles acham que eu sou eu!
O calor deles? O calor deles não é um amigo!
Eles forçam a minha boca para os seus copos de gin
e para o seu pão rançoso.

O que é a realidade
para esta boneca sintética
que devia sorrir, que devia meter as mudanças
que devia escancarar as portas numa desordem sadia
sem evidencias de ruínas ou medos?
Mas eu choraria
enraizada na parede que
em tempos já foi minha mãe
se me lembrasse como
e se eu tivesse lágrimas.



Anne Sexton



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segunda-feira, outubro 06, 2008

tradução caseira da lebre


Isto foi um erro,
estes braços e pernas
que já não funcionam

agora está partido
sem espaço para desculpas.

A terra não conforta,
Apenas cobre
Se tiveres a decência de ficar quieto

O sol não perdoa,
Olha e continua a andar.

A noite infiltra-se em nós
através dos acidentes que
provocámos um ao outro

da próxima vez que cometermos
amor, devemos
escolher primeiro o que matar.



Margaret Atwood



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sábado, outubro 04, 2008

quinta-feira, outubro 02, 2008

tradução caseira da lebre



As minhas palavras exigem silêncio e espaços abandonados



Alejandra Pizarnik



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quarta-feira, outubro 01, 2008

Instruções para chorar

Prescindindo dos motivos, vamos ater-nos à maneira correcta de chorar, ou seja, um pranto que não ingresse no escândalo, nem insulte o sorriso com paralela e torpe semelhança. Consiste o pranto médio ou corrente numa contracção geral do rosto e num som espasmódico acompanhado de lágrimas e ranho, este último no final, já que o pranto termina no momento em que uma pessoa se assoa energicamente. Para chorar, dirija a imaginação para si mesmo, e se isto lhe for impossível por haver contraído o hábito de acreditar no mundo exterior, pense num pato coberto de formigas ou nesses golfos do estreito de Magalhães onde nunca ninguém entra. Quando o pranto começar, cobrirá com decoro o rosto, usando para tal ambas as mãos com as palmas viradas para dentro. As crianças chorarão com a manga do bibe a tapar a cara, e de preferência a um canto do quarto. Duração média do pranto, três minutos.



Julio Cortázar



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